O que seria de nós sem o cinema?

A noite de 04 de abril foi cheia de emoções, com a abertura e a premiação do 44º Festival Sesc Melhores Filmes. Escolhidos por votação do público e da crítica entre janeiro e fevereiro, a revelação dos vencedores foi apresentada pela mestre-de-cerimônias (ou, como ela mesma falou, MC) Roberta Estrela D’Alva. Ao entrar no palco, Roberta declamou um poema de Claudia Schapira com adaptações suas, em que começava perguntando o que seria dos artistas sem o tempo e encerrava dando o mote para outros discursos da noite:

“Arte fugaz sempre por um triz,
mas que reinventa a utopia,
toda hora a cada dia
Nosso imaginário refaz
Criando uma zona autônoma temporária de vislumbre do que virá…
E logo depois, tudo de novo se desfaz… e se refaz, e desfaz, e se refaz, e se refaz
O que seria de nós sem a arte? 
(o que seria de nós sem o cinema?)
(o que seria de nós sem a poesia?)
O que seria de nós?”

O diretor regional do Sesc em São Paulo, Danilo Santos de Miranda destacou o aspecto de resistência que o festival, criado em 1974, sempre teve. “A arte é o nosso campo de liberdade, por onde podemos caminhar em uma perspectiva educativa, de valorização do ser humano, de transformação social, apontando questões, aprofundando temas. E isso realmente tem sido feito de uma perspectiva bastante ampla. Tudo isso para nós, do Sesc, é missão, é caminho permanente”. Danilo ainda destacou a especificidade do cinema, a arte do século, e que engloba em si as demais artes.

Depois de 11 mil votos de público e 118 de críticos de todo o país, os premiados estrangeiros foram anunciados com cenas marcantes dos filmes e suas sinopses (para dar ainda mais vontade de vermos). Moonlight – Sob a luz do luar foi lembrado por todo mundo: Barry Jenkins ganhou o prêmio de direção pela crítica e pelo público, que também premiou Asthon Sanders por sua atuação como Chiron. Os melhores filmes foram Com Amor, Van Gogh e Corra!, por público e crítica retrospectivamente. A crítica escolheu James McAvoy como melhor ator por Fragmentado e Sandra Huller como melhor atriz por Toni Erdmann. A escolha do público de melhor atriz foi Adèle Haenel por A Garota Desconhecida.

As categorias nacionais reuniram grande parte dos vencedores  na sala do CineSesc. Os vencedores de melhor documentário, pela crítica e pelo público, foram Martírio e Arpilleras – Atingidas Por Barragens Bordando a Resistência. Marina Calisto Alves recebeu o prêmio pelo Coletivo Movimento Atingidos por Barragens (MAB) e explicou: “O filme apresenta-se como contra-hegemônico, ao apresentar uma arte que é grito, é denúncia, uma arte que trata da vida de pessoas que muitas vezes não tiveram acesso a salas de cinema, onde agora o filme pode ser exibido”. O filme foi feito coletivamente, desde o seu financiamento até sua divulgação e produção. Vincent Carelli, que apresentou em Martírio a saga coletiva do povo Guarani Kaiowá, agradeceu o reconhecimento na história que é “uma tragédia tão desconhecida e tão presente num momento do país em que todos perdem direitos”.

Na categoria fotografia, o filme Joaquim deu o prêmio da crítica a Pierre de Kerchove, que agradeceu ao diretor do filme, Marcelo Gomes, e destacou a contemporaneidade da história, que se passa nas Minas Gerais do século XVIII. Pierre foi sucedido por Daniel Furlan no palco, que recebeu o prêmio de melhor ator pelo voto popular. Depois de projetos de sucesso na televisão e na internet, Furlan parecia feliz por ter ganho o primeiro prêmio da sua vida, agradecendo todos os inúmeros atores com agendas ocupadas que não puderam fazer o papel de Vadão em La Vingança, dando a ele essa possibilidade. Nelson Xavier foi premiado e homenageado pela crítica por seu papel em Comeback, o último trabalho do ator. Via Negromonte recebeu o prêmio e lembrou sua personalidade de paulistano, discreto por fora e intenso por dentro.

A Glória e a Graça levou quatro prêmios pelo público. Mikael de Albuquerque, premiado pelo roteiro, emocionou-se ao mencionar as pessoas que admira e dividiam aquele momento com ele na premiação, além da equipe, do elenco e da família. Em seu discurso, falou da importância de inclusão de travestis e transexuais à sociedade, principalmente em um país que mata tantos membros da comunidade trans. Além dele, Carolina Ferraz ganhou prêmio de melhor atriz, que atribuiu à empatia que a personagem da Glória recebeu, Flávio Tambellini o de melhor filme e Gustavo Hadba pela fotografia.

Representando Laís Bodanzky, diretora e roteirista de Como nossos pais, Luiz Bolognesi – que divide o roteiro com Laís – subiu ao palco com Carol e Mariá Bodazky, representando a mãe, que não pôde estar presente. As meninas disseram que Laís estaria muito feliz de estar ali e de receber o prêmio e não deixaram escapar a importância de que o filme é feito por mulheres, sobre histórias de mulheres. Mariá destacou como vemos poucas mulheres brancas dirigindo filmes e ainda menos mulheres negras, o que esperam que mude. Logo em seguida, Maria Ribeiro recebeu um prêmio que pela primeira vez acabou em empate: ela e Clarisse Abujamra foram premiadas pela crítica por suas atuações em Como nossos pais. Maria garantiu à plateia que, ao contrário de Carolina Ferraz, ela não interpretou nada: só aproveitou que estava num mau momento na vida na época da gravação (mas pelo menos serviu para alguma coisa!).  

Era o Hotel Cambridge foi unânime para público e crítica e deu os prêmios de melhor direção para Eliane Caffé. Logo depois, o filme de abertura Aos teus olhos, dirigido por Carolina Jabor, ocupou a tela do CineSesc. O filme entra em cartaz no dia 12 de abril e traz Daniel de Oliveira, Malu Galli e Marco Ricca no elenco.

(Foto: Aline Arruda)

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